Beleza patológica.
Viu a outra, magra.
Ela, no espelho, gorda.
Correu para o doutor.
Viu a outra, jovem.
Ela, no espelho, velha.
Correu para o doutor.
Viu a outra, malhada.
Ela, no espelho, flácida.
Correu para o doutor.
Um dia, viu-se espelhada na outra.
Conferiu: mesma boca, mesmos olhos, mesmo nariz, mesmo doutor.
Respirou aliviada.
Finalmente enquadrada.
Vinte. Perfeito.
Arregaçou as mangas.
Um, dois, três, quatro, cinco
Pulou para a próxima etapa.
Um, dois, três, quatro, cinco.
Tirou as meias.
Ao todo dez.
Ufa! Agora sim.
Podia começar a ser mãe.
Subindo ladeira abaixo
Lata d'água na cabeça.
Lá vai Maria. Lá vai Maria.
Trouxa de roupa na cabeça.
Lá vai Maria. Lá vai Maria.
Cesta básica na cabeça.
Lá vai Maria. Lá vai Maria.
Bala perdida na cabeça.
Lá vem Maria. E foi Maria.
Enxugando a ausência
Pano de prato no ombro.
Enxugou o suor.
Pano de prato na mão.
Tirou a assadeira do forno.
Pano de prato no mármore.
Atendeu o telefone.
Pano de prato apertado entre os dedos.
Engoliu a raiva.
Olhou para o pano de prato na mesa de jantar.
Jantamos só você e eu outra vez.
Até que a vida nos separe
Pegou a bolsa.
Deixou a chave.
Pegou o livro.
Deixou o anel.
Fechou a porta.
Abriu uma nova vida.
Borrando o futuro
Preparou o café.
Encheu a xícara.
Café ruim.
Leu a borra.
Futuro amargo.
Precisava trocar a marca do café.
Valeria Pagani
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